Dos cães, para nós
Talvez você já tenha ouvido a explicação sobre o porquê da vida dos nossos cães ser (muito) mais curta que a nossa. Alguém um dia cogitou que nós nascemos para viver uma vida boa, para nos amar e amar o próximo, para sermos bons com os outros. Então, a conclusão óbvia: como eles já nascem sabendo de tudo isso, não precisam de tanto tempo de vida como a gente.
Bem, a explicação para a breve vida de nossos cachorros é biológica. Apenas um palpite meu. Agora, fique aqui mais um pouco e pense comigo sobre a riquíssima mensagem que há para além da literalidade dessas palavras.
Os cachorros se satisfazem com as coisas mais singelas da vida. Uma vareta, uma pedra ou uma bolinha velha de tênis são motivos para o rabo começar a dar sinais de felicidade. Um prato de comida e um prato de qualquer ração promovem a mesma realização. Uma superfície plana (às vezes nem tão plana assim) é suficiente para repousarem e dormirem profundamente até que você o chame para brincar ou comer novamente. Toda aquela empolgação genuína a cada retorno seu à casa faz com que você se sinta notado e querido. Mesmo que você saia e volte para casa cinco vezes em um só dia. E depois sempre vem a troca de carinho. Realmente, os cães vivem pouco, oito, dez, quinze anos, mas vivem esse tempo todo em plenitude.
E a gente? Quanto tempo demoramos para encontrar aquilo que nos torna feliz? Ou melhor, quanto tempo demoramos para admitir que aquilo, ainda que seja materialmente barato, te satisfaz? Quanto tempo demoramos para perceber que aquela comida de sempre que sua mãe faz é realmente a melhor de todas? Sobre isso, depois de um ano morando em Portugal, voltei para o Brasil e minha mãe perguntou o que eu queria comer no meu primeiro almoço aqui. Pensei bastante, afinal poderia querer e pedir praticamente tudo. Bem, acabei escolhendo feijão, arroz, batata, carne de panela e alface. Olha, foi a melhor escolha que poderia ter feito.
Mas continuemos. Espero que ainda esteja aqui comigo, mesmo.
Quanto tempo perdemos até conseguirmos dormir? Quanto tempo de sono é subtraído por nossas preocupações? Quanto tempo perdemos até perceber que aquelas preocupações só se tornaram preocupações porque nossa mente assim desejou? Quantos momentos deixamos de compartilhar com nossos amigos ou com potenciais amigos por achar que veríamos essa mesma pessoa no dia seguinte ou em algum dia da nossa vida? Quanto tempo demoramos para perceber e aceitar que muitas vezes sabíamos que esse dia nunca chegaria e que acabamos optando por viver distantes de nossos semelhantes ou sozinhos sem existir nenhuma razão ou por medo?
Se somarmos todo esse tempo, quanto tempo teremos perdido? Quanto tempo teremos vivido em plenitude?
Mas deixa eu te contar uma segredo. Não há um único indivíduo que não tenha ‘perdido’ tempo, o que nos faz perceber que todos nós precisamos perder tempo primeiro para somente depois começar a ganhá-lo.
Foi um prazer.
t.s
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